Um movimento de avanços em nível federal e também com entidades estatais sobre sustentabilidade está sendo expandido para todos os níveis de governo. Com isso, o setor público está no meio de um grande movimento de padronização, de organização das informações e de ações para a divulgação e prestação de contas seguindo as melhores práticas internacionais. O diagnóstico é do Doutor Ricardo Azevedo, professor na FEARP-USP, durante o painel Agenda de Sustentabilidade no Setor Público, durante o II Encontro ICBR ESG - Normas e Desafios Profissionais, promovido pelo Instituto dos Contadores do Brasil (ICBR).

Ricardo Azevedo disse que o setor público já possui avanços na temática, sobretudo em entidades estatais e paraestatais federais, que já vem se organizando na preparação das informações adequadas para divulgação. O painel debateu os principais atores, papéis e desafios, e também oportunidades - muitas oportunidades - que surgirão. Para ele, é necessário que tanto o setor privado quanto o setor público do país assumam o protagonismo na Agenda ESG, tanto na implementação de padrões internacionais, quanto nas discussões do desenvolvimento das Normas de Relatórios de Sustentabilidade do Setor Público liderado pelo IPSASB (International Public Sector Accounting Standards Board)[1].

O professor na FEA-RP-USP, que também é orientador de mestrado e doutorado, membro dos grupos de pesquisa "Public Sector Accounting Governance in Brazil" e "Resiliência Financeira das Cidades Contemporâneas", e membro dos grupos de normatização contábil CP-CASP/CFC e CTCONF-STN, destacou que não existe mais dúvida de que há uma grande necessidade de respostas para a temática de sustentabilidade em todas as áreas, pois todas as áreas estão sendo cobradas pela sociedade frente à complexidade e contemporaneidade das agendas ESG, que inclui preocupações com os aspectos sociais e de governança, além das mudanças climáticas.

Ricardo Azevedo menciona que há muitas pressões sociais em todas as frentes, justamente para que cada área responda o que se pode fazer na temática de sustentabilidade ambiental e social. “Debatemos sobre essa agenda de sustentabilidade no setor público partindo de pressões de regulação internacional e já de experiências anteriores no Brasil”, ressaltou. O Brasil tem totais condições de contribuir internacionalmente com o debate sobre a regulação, indo além de aguardar a recepção de normas e princípios para posterior implementação. O país já vem assumindo o protagonismo em algumas frentes, como por exemplo, com a atuação direta do Tribunal de Contas da União (TCU) na presidência da Organização Internacional das Instituições Superiores de Controle (INTOSAI)[2] na temática de sustentabilidade.

 

Iniciativas

Fernando Fonseca, economista, fundador e CEO da Multi Capital Solutions, consultoria ESG focada no modelo de Criação de Valor para as empresas, destacou que vem trabalhando com o setor público no âmbito da Comissão Brasileira de Acompanhamento do Relato Integrado (CBARI),  na qual coordena o GT Setor Público, juntamente com a professora doutora Marguit Neumann, professora da Universidade Estadual do Maringá (UEM).

O GT Setor Público teve apoio total do Tribunal de Contas da União (TCU), o protagonista que determinou, por meio da IN-TCU n.º 84 (22/04/2020), a elaboração do Relatório de Gestão na forma do Relato Integrado como componente fundamental para a prestação de contas dos administradores e responsáveis da administração pública federal, contemplando os três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Então, ao TCU adotar o relato integrado como instrumento de gestão e de prestação de contas, prestou uma grande contribuição. “O setor público tem muito a contribuir com o setor privado e toda sociedade. É um grande desafio, mas cada vez mais é possível perceber os líderes públicos de todos os poderes entendendo que essa agenda ESG é uma agenda de todos. E se ele é um ente público, tem quase que uma responsabilidade, um dever de trazer esses desafios para a sua agenda, seja no Poder Judiciário, Executivo ou Legislativo”, afirmou.

Existem várias iniciativas em curso. Além do TCU, Fernando Fonseca lembrou que o Tesouro Nacional divulgou, em setembro de 2023, o documento “Arcabouço Brasileiro para Títulos Soberanos Sustentáveis”, cujo o objetivo é o de estabelecer o arcabouço para a emissão de títulos públicos verdes, sociais e/ou sustentáveis no mercado internacional, conforme a estratégia de sustentabilidade do Brasil. “É um grande avanço. Também podemos citar a Comissão de Valores Imobiliárias (CVM), outro órgão regulador, que determinou por meio da Resolução CVM n.º 193 a elaboração e a divulgação do relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, pelas companhias abertas, fundos de investimento e companhias securitizadoras, com base no padrão internacional emitido pelo International Sustainability Standards Board (ISSB).  Estou acompanhando de perto esse grande avanço no Setor Público e acredito ser uma grande oportunidade para o Brasil, de maneira integrada, consolidar-se como protagonista na agenda ESG em relação ao mundo”, comemorou.

 

Caso de sucesso

Giovanna Leal, Administradora, especialista em gestão estratégica e em gestão da mudança, com mais de mais de 15 anos de experiência na implementação de projetos para empresas estatais e paraestatais voltados à elaboração, desdobramento e monitoramento de planos estratégicos, indicadores de desempenho e relatórios de gestão, apresentou a jornada do SESI e do SENAI para absorver e prestar conta utilizando a metodologia de relato integrado.

O SESI e o SENAI estão presentes nos 27 estados da federação. São mantidos pelas indústrias, fazem parte dos Serviços Sociais Autônomos, ou seja, têm administração e patrimônio próprios, e trabalham em cooperação com o Poder Público – por isso seguem as diretrizes do Tribunal de Contas da União.

As instituições possuem uma governança peculiar e que foi decisória para o processo. O Departamento Nacional é responsável por promover, de forma executiva e sistêmica, os objetivos institucionais. Já os Departamentos Regionais executam os serviços institucionais em sua respectiva base territorial.

Eles interagem e se conectam permanentemente, mas gozam de autonomia par administrar seus recursos humanos, físicos e financeiros. Por conta disso, quando somados, anualmente são produzidos 58 relatórios de gestão seguindo o mesmo modelo, mesma narrativa, o mesmo projeto gráfico. O trabalho foi iniciado em 2018 para agora atingir o resultado esperado: relatar o valor do SESI e do SENAI para a indústria, seus trabalhadores e a sociedade.

A administradora destacou que os Departamentos Nacionais e Regionais têm diferentes níveis de maturidade de gestão. O desafio de evoluir em conjunto exigiu muita interação, muita conversa, muito compartilhamento. “E foi o que fizemos durante esses anos”, disse.

Giovanna Leal explicou que, ao longo dos anos, em torno de de 400 pessoas, de diferentes perfis, foram envolvidas nessa jornada. “Hoje em dia, temos um ambiente de aprendizado e compartilhamento mútuo, com todos em busca do mesmo objetivo”, comemorou, ressaltando que o SESI e o SENAI estão colhendo melhorias.

De acordo com ela, a necessidade de adequação a Instrução Normativa do TCU foi recebida como oportunidade e, com os ajustes necessários, houve um salto significativo na gestão. Os instrumentos de estratégica, planejamento e monitoramento, incluindo o Site da Transparência, foram aprimorados e todos possibilitam colher a mesma narrativa.

Fundamental, também, no resultado, é que externamente a sociedade tem mais clareza do valor do SESI e do SENAI, seu trabalho em todos os estados e como ajudam o setor industrial a prosperar, que é o cliente principal. “Atualmente, as pessoas entendem o que o SESI e o SENAI devolvem para a indústria, o que melhoram no setor que, naturalmente, estando mais fortalecido e amadurecido, devolve para o País”, ressaltou.


[1] Mais informações disponíveis em: https://www.ipsasb.org/news-events/2024-06/ipsasb-developing-first-public-sector-sustainability-reporting-standard-support-world-bank

[2] Mais informações disponíveis em: https://portal.tcu.gov.br/relacoes-institucionais/relacoes-internacionais/